Ilha de Algodoal: Temporada de reprodução das tartarugas marinhas

Filhotes de tartaruga marinha nascem na praia da Princesa, Ilha de Algodoal.  (FOTO: DENILSON D'ALMEIDA)
Um dos maiores desafios da humanidade é manter o equilíbrio ecológico e buscar o desenvolvimento econômico e social respeitando o meio ambiente. 
Praia da Princesa, ilha de Algodoal.  (FOTO: DENILSON D'ALMEIDA)
Nestes tempos de pandemia de covid-19, quando o homem precisou permanecer mais tempo em casa para evitar a contaminação pelo coronavírus, a natureza se encarregou de mostrar o quanto ela precisa ter o seu espaço respeitado para que a vida nasça, cresça e se reproduza proporcionando cenas e imagens que estavam cada vez mais raras de serem observadas. Foi o que aconteceu, por exemplo, na ilha de Algodoal, no município de Maracanã, nordeste paraense. O lugar, que por sinal é uma área de preservação ambiental, deixou de receber visitantes por cerca de três meses como forma de diminuir os riscos da chegada do coronavírus.
No entanto, o que a comunidade mal sabia era que a decisão de suspender a atividade do Turismo também traria outros resultados incríveis para a ilha. Um deles foi tornar as praias locais um cenário ideal para que as tartarugas marinhas desovassem na areia.
Algodoal sempre foi local de desova para tartarugas, mas nos últimos anos isto vinha ocorrendo com menos frequência em decorrência da ação humana. Com as praias praticamente desertas estes animais, que estão ameaçados de extinção, voltaram a fazer seus ninhos com maior frequência.
Vale ressaltar, entretanto, que os próprios cientistas e pesquisadores ainda não confirmam essa teoria, mas os dados levantados já apontam para isso.
O período de reprodução das tartarugas ocorre entre os meses de abril a setembro e até o final do mês de julho cinco ninhos já haviam sido encontrados e identificados pelos pesquisadores do Projeto Suruanã – ligado a Universidade Federal do Pará. Acredita-se que o número de ninhos deva ser maior, uma vez que o trabalho de monitoramento tem sido feito somente por uma única voluntária do projeto, que mora na ilha.
No último dia 1, 43 filhotes de tartaruga marinha da espécie Oliva (Lepidochelys olivacea) foram soltas na praia após terem passado por um processo de identificação (biometria, como é chamado esse trabalho). Cada um dos filhotes foi medido e pesado e avaliado se estavam em condições de serem soltas. Se conseguirem sobreviver, principalmente à ação de predadores naturais, os filhotes vão levar 25 anos para chegar a fase adulta, idade em que as fêmeas poderão começar a reproduzir – e quem sabe retornar à ilha de Algodoal para colocar seus ovos.
A coordenadora do projeto, a bióloga Josie Barbosa, ressaltou que as cinco espécies de tartarugas marinhas que existem na costa brasileira já foram vistas no litoral paraense. Inclusive, nestes 10 anos trabalhando com estes animais, ela já catalogou 200 tartarugas.
(FOTO: DENILSON D'ALMEIDA)
“Na verdade a gente coloca um anilha nelas e isso as identifica. Quando fazemos isso, a gente avalia o estado de saúde, verifica o peso e o tamanho. Fazemos todo um trabalho que vai auxiliar na conservação da espécie”, pontuou.
As informações extraídas com a pesquisa em cada animal vão para um banco de dados que pode ser acessado por pesquisadores da UFPA e também pelos pesquisadores do projeto Tamar. “Os dados poderão ser acessados e partir deste ano poderão ser publicados e servir de base para pesquisas, artigos e demais produções de conteúdo científico”, disse Josie.
A bióloga explicou que as tartarugas marinhas desempenham um papel importante no ecossistema. Elas se alimentam das algas e com isto fazem o equilíbrio delas no mar. E as algas são as responsáveis pela produção de oxigênio em todo o planeta. “Esse equilíbrio garante a nossa sobrevivência”, reforçou Josie.
Não podia faltar a selfie com as pesquisadoras. Neste momento elas transportavam os ovos para um local mais seguro (outro ninho)
O projeto Suruanã atua em três frentes de trabalho. O primeiro fazendo o trabalho de monitoramento da reprodução das tartarugas marinhas, mas isto só foi possível depois de uma trabalho de Educação Ambiental com os pescadores da região dos municípios de Curuçá (onde o projeto está sediado) e também de Algodoal. A terceira linha de trabalho está focada justamente na interação do projeto com a pesca. “Os pescadores tem sido grandes parceiros. Principalmente quando uma tartaruga fica presa nos currais e eles acionam a gente para fazer o resgate e tratar o animal", comentou.
Ninhos com ovos de tartaruga marinha (FOTO: DENILSON D'ALMEIDA)
Na ilha de Algodoal, a voluntária do projeto é a Alcione Alves, que há 15 anos monitora as tartarugas marinhas na Ilha. Foi ela, inclusive, que identificou os cinco ninhos com ovos depositados por tartarugas na área do entorno da Praia da Princesa. “Faço esse trabalho antes da existência do projeto Suruanã porque sempre tive um carinho pelas tartarugas e sei da importância delas. No início foi muito difícil cheguei a travar brigas com alguns pescadores por causa delas. Hoje eles me ajudam com o meu trabalho”, disse.
Ela recolheu os ovos que estavam em áreas de risco e transportou até ninhos que ela montou próximo a barraca onde mora. “Eu espero, eu luto por isso há muito tempo. Pela conservação das espécies” contou emocionada. Em 15 anos fazendo o trabalho de monitoramento ela diz que já ajudou entre 80 a 90 a tartarugas a desovar. “Uma noite um cachorro latia muito para uma tartaruga e ela não conseguiu depositar os ovos. Voltei por várias vezes ao local, mas ela não retornou. Tive que conversar com a dona do cachorro para mantê-lo preso, a noite porque ele assustava as tartarugas”, comentou Alcione.
A soltura dos filhotes ocorreu no fim da tarde e, como ainda havia veranistas na praia, várias pessoas assistiram a chegada das tartarugas na água. “Foi mágico, eu cheguei a tocar em uma. Foi a melhor experiência da minha vida. Hoje eu tenho mais um motivo para querer a preservação da ilha. Algodoal é especial", descreveu o advogado Marcelo Brendo, 28.
(reportagem escrita para o jornal DIÁRIO DO PARÁ. Publicada em 9/8/20)

As cores do reggae dão tom e melodia à praia da Princesa, na Ilha de Algodoal. (FOTO: DENILSON D'ALMEIDA)

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