Resumo
A inauguração da TV Marajoara – Canal 2, em 1961, marcou o começo da modernidade em Belém. A emissora tinha como objetivo exaltar e promover a cultura regional, este era o sonho de Frederico
Barata, seu fundador e pai da televisão paraense. O Canal 2 foi a maior emissora de televisão que já existiu no Pará, nunca nenhum veículo televisivo local produziu tantos programas e novelas quanto a TV Marajoara. Tudo feito ao vivo, contando com pouca tecnologia, mas com um imenso talento de profissionais.
Depois dela vem a TV Guajará – Canal 4, em 1967, cujo dono foi Lopo de Castro e em 1976 a TV Liberal – Canal 7 que inicia uma nova fase na história da televisão paraense. A transmissão de programas “enlatados” tornou os produtores locais em consumidores de programas nacionais, desvalorizando a cultura regional.
Palavras-chave: Televisão / História / Pará
Televizinha
Este artigo é parte de um estudo sobre a chegada da televisão no Pará, em especial da trajetória da TV Marajoara inaugurada na década de 1960, pertencente aos Diários Associados, que inaugurou a era da televisão no Estado. A pesquisa consiste, principalmente, na obtenção de depoimentos e entrevistas realizadas com profissionais que trabalharam no extinto Canal 2 onde tudo era feito ao vivo com talento, paixão, improviso e sem o recurso do videoteipe; e também numa visita técnica realizada na TV Cultura do Pará, em 18 de maio de 2009, na era da rede mundial de computadores, para conhecer as instalações e coletar dados para termos uma base de como se dá o funcionamento desta máquina mágica chamada televisão.
O nosso estudo consistiu em conversar com artistas, jornalistas, apresentadores e realizadores que viveram o considerado laboratório da televisão paraense e comandaram programas que serviram de inspiração para criação de programas exibidos em rede nacional. Também conversamos com jornalistas, produtores, técnicos e cinegrafistas que trabalham fazendo televisão de hoje, que está em fase de transição para a digitalização, com recursos tecnológicos sofisticados que chegam a gerar imagens até via satélite e ainda contam com a rede mundial de computadores.
Ao longo do desenvolvimento deste trabalho percebemos a semelhança da história da televisão paraense com a história da televisão brasileira. A primeira emissora inaugurada no Brasil foi a TV Tupi, pertencente aos Diários Associados, de Assis Chateaubriand, e no Pará foi a TV Marajoara que era filiada a Rede Tupi, inclusive o próprio indiozinho que era logo da Tupi era utilizada pela Marajoara. Outra comparação é que a história da televisão no Brasil é estudada em dois momentos: antes da inauguração da TV Globo (fase dos Diários Associados e TV Tupi) e pós TV Globo, de Roberto Marinho, marcado pela entrada de capital estrangeiro; aqui no Pará, a história da televisão também se divide em dois períodos: antes da TV Liberal, de Rômulo Maiorana, e após a inauguração da TV Liberal (afiliada da TV Globo).
No fim vamos constatar que apesar dos inúmeros avanços que a televisão paraense sofreu e sofre até hoje perdeu espaço para os programas chamados de enlatados, deu por fim a procura por novos talentos artísticos, reduziu consideravelmente a criação de programas regionais que valorizem o talento e a criatividade local e excluiu da sua grade a produção de novelas feitas aqui mesmo.
Viva! O progresso chegou à capital paraense.
O cenário político do ano de 1961 se faz a favor de João Goulart para presidente da república. Aqui no Pará, o governador Aurélio do Carmo tentava reunir representante dos três poderes para discutir o favoritismo da posse de Goulart em Recife. Entretanto, aquele mês de setembro entraria para a história não pelo contexto político e sim pela tão sonhada modernidade que adentrava os lares das famílias paraenses. Uma torre era erguida na capital paraense, mais precisamente na Avenida São Jerônimo (hoje Governador José Malcher), mudava a paisagem da cidade, levando a população olhar para cima – era a torre da TV Marajoara que naquele momento simbolizou soberba, ousadia e o passaporte para a modernidade.
Fazia 11 anos que a TV Tupi havia sido inaugurada no Brasil, mas Assis Chateaubriand, considerado o pai da televisão brasileira, queria expandir a emissora criando Rede Tupi comandada pelo grupo Diários Associados (DA), no qual ele mesmo era dono. Frederico Barata era o superintendente dos Associados na Região Norte do Brasil, coube a ele o papel de sonhar e inaugurar a TV Marajoara – Canal 2.
Em 30 de setembro de 1961, o sonho se tornou realidade a TV Marajoara começou a operar naquele dia. A televisão era tida como o “marco do progresso”, ela levava a família paraense o admirável mundo novo. Para Frederico Barata, mais que modernizar a televisão tinha como objetivo ser um veículo de cultura para a cidade, já que a partir daquele momento Belém se igualaria aos mais adiantados centros artísticos do mundo. A atriz Nilza Maria denomina Frederico como o pai da televisão paraense.
“E nas plagas distantes, neste Brasil imenso. Ninguém mais poderá menosprezar a nossa cultura e o nosso desenvolvimento, porque, quando alguém quiser apoucarnos, logo redarguiremos com orgulho que somos uma cidade em tão franco progresso que até televisão já possuímos [...] Está inaugurada no Pará a era da televisão.”
(trecho do discurso de Frederico Barata durante a inauguração da TV Marajoara, 30/09/1961)
No ar e ao vivo: O indiozinho tupi.
Há quem diga que a televisão cresceu aos moldes do rádio, todavia é preciso muito cuidado ao tentar confirmar isto. O que aconteceu foi que a TV buscou nas rádios, profissionais e artistas que já faziam sucesso e estavam familiarizados com o improviso, assim foi com a TV Marajoara que trouxe da Rádio Marajoara, inaugurada em 1954, uma leva de atores e atrizes, jornalistas e locutores para compor o seu quadro de elenco. Todos passaram por testes feitos por Péricles Leal, primeiro diretor da televisão paraense, que treinou pessoalmente grande parte do elenco e foi um dos mestres que ensinou como se fazer televisão.
Durante os anos em que nós trabalhamos na Rádio Marajoara a gente adquiriu a experiência de interpretar textos ao vivo. Era com aquela responsabilidade de fazer tudo certo, não podia errar porque nós gravávamos ao vivo, então fazíamos tudo com cuidado. Quando eu fui para a televisão, eu já fui unir a experiência que eu tinha da Rádio Marajoara, de interpretar textos, interpretar personagens, ao vivo. Então levei a segurança do meu trabalho, aquela experiência que eu já tinha de compor personagens, já levei para a televisão.
Agora naturalmente que muda. Enquanto lá você trabalhava com a voz, na TV você tem que ter o cuidado, primeiro, qual a posição que você fica, o ângulo que você vai ser filmado, qual é o momento em que vai apagar, qual é o momento que a câmera está te focalizando... então tudo isso veio juntar uma experiência de leitura de texto com a vivência de personagens.
(depoimento da atriz Nilza Maria feito durante a pesquisa de campo.)
A TV Marajoara adotou a mesma logomarca da TV Tupi – o indiozinho que fazia menção aos índios Tupinambás como forma de identificação da cultura nacional. A programação da Marajoara foi rica e diversificada, ia desde programas de entrevistas até a produção de telenovelas ou teleteatros como alguns preferem chamar. Cláudio Barradas, ator e realizador, que diz que nunca existiu teatro na TV uma vez que o público assistia ao espetáculo em casa e não diante do cenário em que a produção acontecia. Tudo feito aqui, por uma equipe de aproximadamente 100 pessoas, dentre cenógrafos, costureiras e maquiadores.
Na dramaturgia, quatro eram os realizadores: Maria Sylvia Nunes, Raymundo Mario Sobral, Maria Helena Coelho e Valdir Sarubbi. Eles eram os responsáveis por escrever novelas, fazer adaptações de outras obras para a televisão e roteirizá-las. Maria Sylvia comenta que a maior parte dos textos eles mesmo escreviam e/ou adaptavam, apesar de que podia vir obras de qualquer outra emissora da rede dos DA.
A gente se dava o luxo de até fazer experimentos. Eu me lembro que uma vez eu tirei de um livro de Sartré, que era o filósofo da moda naquele tempo, não era um romance era um livro de filosofia, eu tirei um episódio em que ele narra que um rapaz que estava num dilema da seguinte maneira: Durante a ocupação nazista na França, ele não sabia se entrava para a resistência, portanto ia para a ilegalidade, ou se ficava em Paris cuidando da mãe que era velha e estava doente. Então o dilema dele era cumprir o dever de cidadão ou de filho, então isso era um problema, vamos dizer... moral, e eu resolvi fazer todo em close up e detalhe. Nós nem tínhamos cenário porque era todo em close up e detalhe. Ficou ótimo o programa, nós adoramos.
(Relato de Maria Sylvia Nunes feito durante a pesquisa de campo.)
Outra coisa errônea de se dizer é que no início tudo era feito com improviso, pois o improviso existe até hoje, a diferença é que no começo se fazia televisão ao vivo, já que o videoteipe chegou alguns anos depois que a TV Marajoara já estava no ar. Portanto, realizadores e elenco tinham que pensar instantaneamente (improvisar) em como esconder algum imprevisto como, por exemplo, o ator esquecer o texto. Hoje, com exceção dos telejornais, a maioria dos programas são gravados e os erros não entram no ar como no tempo do ‘ao vivo’, caso a atriz esqueça a sua fala durante a gravação ela conta com o apoio do diretor para gritar “corta!” e voltar a cena de novo. No Pará, a produção local de telenovelas não compõe mais a grade de programação, então o dito improviso fica por conta do apresentador de tal programa e do repórter que entra ao vivo durante alguma externa.
Além da programação normal a TV Marajoara realizava externas com transmissão direta de eventos importantes como o Círio de Nazaré, dada a carência de equipamentos (só tinha um transmissor de microondas) uma equipe se dirigia até a Catedral da Sé fazia a saída da procissão, depois desmontavam todo o equipamento e seguiam direto para o CAN para fazer a chegada da romaria, assim só era transmitida a saída e chegada do Círio. Dentro deste contexto pode-se dizer que a TV Marajoara, laboratório e escola que formou profissionais que vieram a trabalhar nas emissoras que vieram depois, era uma TV artesanal feita praticamente por pessoas altamente gabaritadas e com potencial incrível. O ator e escritor João de Jesus Paes Loureiro, define a TV Marajoara como a “TV em que tudo tinha que ser feito. Era o novo diante da cidade”.
“Tudo começou com a ordem de Assis Chateaubriand: ‘quero uma TV no Pará, os Associados têm que ser mais uma vez pioneiros’. Frederico Barata, Milton Trindade e Alfredo Sade, trio que formava a direção do grupo no Estado do Pará, não objetaram à ordem do “patrão”, e começaram a planejar e trabalhar.
Começou pela construção do prédio e importação dos EUA do equipamento. Simultaneamente, enviaram para a TV Ceará, em Fortaleza, a equipe técnica e de operadores, para cumprirem estágio na co-irmã, recém-inaugurada. Uma vez preparada a equipe volta para Belém a fim de treinar os demais e aguardar a inauguração da TV Marajoara, Canal 2.”
(Waterloo Assis. Memória da Televisão Paraense e os 25 anos da TV Liberal, 2002)
Após quase seis anos no ar, em 1967, a TV Marajoara ganhava a sua primeira concorrente no Estado – a TV Guajará. Agora eram duas emissoras que adentravam na casa da família paraense. Além da briga pela audiência, outra nova disputa acontecia na casa dos telespectadores, pai queria assistir a transmissão da TV Marajoara e mãe querendo assisti a nova programação do novo canal e vice-versa. Com apenas uma televisão em casa, como fazer? A publicidade, aproveitando-se desta situação, entrou imediatamente no ar ofertando aparelhos televisores como forma de apaziguar brigas.
Chegou a vez do Saci
A história da televisão tanto brasileira quanto paraense sempre esteve ligada a política. Concessões e propriedades sempre estão entrelaçadas a apoio partidário e apadrinhamento político. A saga da TV Guajará é o maior exemplo disto. Inaugurada em 27 março de 1967, o Canal 4 era propriedade de Lopo de Castro, prefeito de Belém por dois mandatos e várias vezes deputado federal, Devido aos seus compromissos políticos quem assumiu a direção da TV foi sua esposa Conceição Lobato de Castro.
Como na TV nada se cria tudo se copia. O Canal 4 usou como logomarca uma figura do Saci Pererê como forma de exaltar a cultura amazônica e recebeu nome de TV Guajará para homenagear a Baía que fica em frente a cidade de Belém. Entrava no ar às oito horas da manhã enquanto que a sua concorrente, a TV Marajoara, entrava às quatro horas da tarde. O equipamento da TV Guajará era todo nacional, nada veio de fora; telecine, câmeras, monitores e transmissores tudo fabricado no Brasil, pela extinta Maxell.
A Guajará introduziu na história da televisão paraense programas infantis como o ‘Capitão Lourenço’, apresentado por Kzan Lourenço que se imitava um velho capitão de 70 anos de idade que contava as suas aventuras para crianças que estavam nos estúdios, alguns deste programa chegaram a ser exibidos direto do navio Corveta Iguatemi, da Marinha, que realizava passeios na Baía do Guajará. Na dramaturgia, o destaque foi para as telenovelas globais ‘Selva de pedra’ e ‘Pigmaleão 70’ transmitidas pela Guajará.
O Canal 4 pode ter sido a segunda emissora paraense, mas foi a primeira afiliada da TV Globo, que até então só tinha em São Paulo e no Rio de Janeiro. Também foi a primeira emissora paraense a transmitir missa graças a uma autorização de D. Alberto Gaudêncio Ramos, Bispo de Belém na época.
No telejornalismo uma novidade. Em meio a ditadura militar a Rede Globo de Televisão estréia o Jornal Nacional e dentro dele concedia para a TV Guajará um tempo de três minutos para as notícias locais – no Pará, este jornal em formato de lapada era chamado de ‘Jornal Nacional Edição Local’, apresentado por Carlos Benedito.
Os primeiros seis meses do tempo em que a Guajará transmitia a Globo foi em caráter experimental, Roberto Marinho, presidente das Organizações Globo, hoje falecido, não acreditava ainda na nacionalização das redes de televisão haja vista que cada região tinha a sua cultura e o seu sotaque próprio. Depois disso, o contrato foi firmado por mais seis anos. Quando chegou o período de renovar o contrato de concessão da TV Guajará como afiliada da TV Globo, o então presidente militar Ernesto Geisel pede a não renovação do contrato para Roberto Marinho porque o Canal 4, de Belém, apoiava Jarbas Passarinho com quem ele tinha divergência política.
Sem concessão a TV Guajará passa a ser independente por alguns anos e sobrevive com recursos do próprio Lopo de Castro, até o período em que passa a ser primeira afiliada da TV Bandeirantes que começara a se firmar no sul do Brasil. O andar 25 do Edifício Manoel Pinto da Silva já não suportava mais estruturar uma emissora de televisão, era necessário a compra de novos equipamentos e de um espaço maior. Como a TV Marajoara tinha fechado as portas em 1980, Lopo compra o prédio onde funcionou a sua maior concorrente e instala novos equipamentos.
No entanto, um novo golpe atinge o “Saci Pererê”, a TV Bandeirantes corta a concessão da emissora porque emergia no Pará um novo grupo de comunicação que comandada por político influente, que conseguiu tomar da TV Guajará a concessão, inaugurava-se no Pará a TV RBA – Canal 13. A TV Guajará passa a transmitir a extinta TV Manchete, que logo mais tarde fecharia as portas. A TV Guajará acabou sendo vendida para um grupo evangélico que criou a Rede Boas Novas, as negociações começaram em 1993 mas a venda só foi efetuada em 1995.
No ar a TV Liberal: Uma nova televisão para o Pará
A TV Liberal Canal 7 dá início à sua programação inaugural, num acontecimento histórico para a capital paraense pela alta expressão do empreendimento e sua grande repercussão na vida social e econômica do Estado.
(Jayme Bastos. Anuncio de inauguração da TV Liberal, 27/04/1976)
A cidade de Belém parou para assistir a inauguração da TV Liberal, em 27 de abril de 1976. Começa a partir de agora uma nova fase para a televisão paraense. A história da TV Liberal se assemelha a história da TV Globo, ambas dividem, no Pará e no Brasil, a história da televisão, foi a partir delas que o capital estrangeiro entrou nos meios de comunicação de massas, a influencia que elas exercem é tão forte que chega a atingir a quem está no poder. Dentre as autoridades presentes na inauguração da Liberal estava o Ministro das Comunicações Euclides Quandt de Oliveira, que veio representar o presidente Geisel que não pode comparecer, e a alta cúpula da Globo que representavam Roberto Marinho.
O Canal 7 contratou profissionais gabaritados, alguns até da TV Marajoara, como exemplo podemos citar o jornalista Ubiratan de Aguiar, que usa o pseudônimo de Pierre Beltrand. A programação inaugural durou três dias e só a partir de 1º maio daquele ano foi que ela passou oficialmente a transmitir a TV Globo. A história da tecnologia da TV Liberal passa pela era do filme (película), do videoteipe e do satélite. A inauguração e a realização do Canal 7 foi pensado por Rômulo Maiorana, uma das grandes personalidades paraense.
Rômulo Maiorana era chamado de jornalista porque escrevia os seus artigos no jornal, mas ele era um homem de sociedade. Quando você convive no meio social, você articula socialmente as aproximações ou alguém que tem a facilidade de atingir e satisfazer os seus desejos. Ele soube se relacionar socialmente. Rômulo Maiorana foi um homem de classe A e B, nunca foi um homem de classe baixa, então quando ele veio de Pernambuco pra cá, em 1953, ele começou a freqüentar a alta sociedade, Assembléia Paraense, Iate Clube do Pará, então ele soube articular porque ele era um homem empreendedor. Esse mérito ninguém tira dele. [...] Rômulo Maiorana soube se aproximar de Passarinho, Gerson Peres, se aproximar daquela velha guarda da ARENA que hoje está com aquele modelo de PP – Partido Progressista – então esta questão de se aproximar do Regime e se favorecer foi a mesma estratégia usada por Silvio Santos para conseguir a rede dele. Então, Rômulo Maiorana soube, com a sua comunicação, persuadir as pessoas. Era uma cara nova, era um homem que supostamente não tinha ligação política nenhuma.
(relato de Zé Carlos Reis feito durante a pesquisa de campo)
Num pensamento crítico sobre a trajetória da TV Liberal, desde a sua inauguração, até a atualidade, vemos que além de abrir as portas para o capital estrangeiro ela traz como ponto negativo o término da produção local de programas e de telenovelas. A TV Liberal passa a transmitir os “enlatados”, nome dado aos programas prontos que vem da rede nacional, deixando apenas o telejornalismo como único setor para se fazer televisão no Estado. Se pararmos para pensar um pouco mais, a TV Liberal não é a única a ter os melhores equipamentos tecnológicos, todas as emissoras devem possuir os melhores recursos, a Liberal apenas deu o ponta-pé inicial para a corrida das inovações tecnológicas.
Morre o indiozinho no Pará
Era o ano de 1980 quando o Governo Militar extingue os jornais e emissoras dos Diários Associados. No Pará, a TV Marajoara saia do ar. Acabava ali o sonho que tinha se tornado realidade, desde então nenhuma emissora de televisão produziu tanto e levou ao ar programas com o mesmo nível de qualidade. A partir daquele momento, os enlatados já ocupavam a maior parte da grade de programação e para os profissionais restavam apenas telejornais.
Eu já não trabalhava lá no dia em que o Governo Federal decretou seu fechamento, juntamente com outras emissoras de TV dos Diários Associados, em razão de problemas diversos que, diga-se de passagem, não ocorriam em Belém. Foi em 16 de julho de 1980 e lembro que estava saindo de casa para participar de dois eventos – a colação de grau em engenharia do meu irmão Celso e a homenagem que seria prestada ao Rômulo Maiorana como empresário do ano – quando ouvi o ‘Jornal Nacional’ dar a notícia. Foi um verdadeiro soco no estômago. Cheguei a chorar porque um pouco da minha vida tinha sido extinta.
(Abílio Couceiro. Memória da Televisão Paraense e os 25 anos da TV Liberal, 2002)
Mesmo já existindo o videoteipe nesta época, novelas e programas da TV Marajoara que marcaram os “tempos heróicos” da televisão paraense ficaram gravados apenas na memória. A cobertura do Círio, em 9 de outubro de 1961, primeira externa da televisão paraense é um exemplo disso, juntamente com o golpe militar de 1964 que foi noticiado por Abílio Couceiro e também a chegada do homem à lua, em 20 de julho de 1969, transmitida pela Marajoara um dia após o acontecido por causa da pouca tecnologia.
Pierre Show
De todos os programas genuinamente paraense um merece destaque: Pierre Show, apresentado pelo jornalista Ubiratan de Aguiar, que utilizava o pseudônimo Pierre Beltrand. O programa começou na TV Marajoara e depois foi feito na Guajará e posteriormente na TV Liberal. Ubiratan viveu o tempo do improviso, passou do preto e branco para a TV em cores e seu programa foi modelo que a rede nacional copiou. Celebridades nacionais vinham para se apresentar no programa local.
Eu consegui dominar o improviso na televisão porque o meu programa, Pierre Show, na TV Marajoara, durante uma hora, era todo improvisado. De vez em quando dava um apagão, mas eu saía de letra. Eu trazia do Rio e de São Paulo artistas famosos, como o prórpio Roberto Carlos.
Meu programa era aos domingos das nove às dez da noite, nele eu também dava o “notícia da sociedade”. Tinha o cineminha do Pierre [...] foi o primeiro programa ao vivo da TV paraense... Então o Pierre Show tinha um aspecto político, artístico e social. Começou do preto e branco e depois passou para o colorido. Agora tem um fato muito interessante, o Pierre Show foi o programa de maior audiência da televisão paraense, por quê? Porque só tinha uma emissora na época, então as pessoas tinham que me assistir.
(depoimento de Ubiratan de Aguiar, recolhido durante a pesquisa de campo)
A espera pela digitalização
A TV paraense vive o advento da internet, ficou mais rápido e mais fácil se fazer jornalismo, contudo um novo formato de televisão deve entrar no ar a partir de 2017: a TV digital que além de melhorar a qualidade de imagem e áudio da TV atual tentará fazer o telespectador interagir de maneira mais eficaz. Hoje, a tecnologia enxuga o que pode o número de profissionais que trabalham fazendo, a inserção de transmissões via satélite possibilitam externas em lugares distante num curto espaço de tempo, 1,5 segundos. Por outro lado, predomina na programação regional a produção da rede nacional o que transformou os produtores de televisão local em consumidores. O centro artístico agora fica no sul do país, excluindo da programação o talento de artistas regionais e reduzindo o número de programas locais.
Para exibir um programa regional a afiliada depende da autorização da emissora nacional. A única emissora paraense que ainda se preocupa em criar programas que valorizem o a cultura do Estado do Pará, sem ser através do jornalismo, é a TV Cultura do Pará – Canal 2, emissora pública do Estado inaugurada em 13 de março de 1987. É no Canal 2 que o programa mais antigo da televisão paraense existe – O sem censura Pará - que está no ar a mais de 20 anos.
Referências Bibliográficas
ORGANIZAÇÕES RÔMULO MAIORANA. Memória da Televisão Paraense e os 25 anos da TV Liberal, Belém – PA, Secult. 2002
Documentário Televizinha, Belém – PA. 2009.
AGUIAR, Ubiratan de. Idas e vindas – Fiéis relatos sobre fatos e pessoas. Gráfica Sagrada Família, Belém – PA. 2005.
Coleta de dados e pesquisa de campo realizada pela equipe, entre os dias 24 de abril de 2009 e 22 de maio de 2009. Entrevistados para este trabalho: Maria Sylvia Nunes, João de Jesus Paes Loureiro, Nilza Maria, Pe. Claudio Barradas, Zé Carlos Reis. Visita técnica a TV Cultura do Pará em 21 de maio de 2009.
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